Dos farrapos estropiados do tecido do nosso coração, sobejam linhas por onde coser. Esventrados, visceralmente desabitados, recolhemos os restos do que deixámos desfazer. Pacientemente, ensimesmados, remendamos pedaços do que outrora quisemos intacto e entregámos sem cuidar. Transplantamos um coração que sabemos torpe, feio, exausto e, já dentro do corpo, fechamos a ferida na esperança vã de que as artérias cumpram o seu trabalho e irriguem o alimento necessário a fazê-lo voltar à vida. Esperamos angustiados que o batuque se volte a ouvir, que o corpo reconheça o calor que dele emana, que um sopro de vida nos permita voltar a respirar. Esperamos que o recobro seja curto, que a ferida sare e que a cicatriz seja quase invisível. E chamamos a nós a força de um gigante para que a flat line deixe de ser tão monótona e renove os altos e baixos que sempre nos habituámos a ver plasmados no ecrã. Vivemos em câmara lenta à espera que um dia voltemos a sentir deliciosas arritmias, que aquele coração, em delírio, se esqueça de bater, que a dor que sinta, seja a dor da paixão e do amor, que o palpitar descontrolado se deva ao esforço da entrega de dois corpos.
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